Contra o fascismo

People have their fingers broken.
To be insulted by these fascists
Is so degrading and it's no game.
(David Bowie)




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Saiu a notícia no Centro de Mídia Independente descrevendo o conflito, ocorrido dia 11 deste mês, entre estudantes e técnicos da Universidade Federal de Santa Catarina. Os servidores realizaram o bloqueio das principais entradas da Universidade, no que foram atacados por um grupo de estudantes. Cena deplorável em todos os sentidos. Está tudo errado.

O uso da violência é uma medida inteligente ou mesmo necessária somente em raríssimas exceções, como a legítima defesa. Mesmo assim, usada de forma proporcional, sem sadismo. Todavia, se nada pode justificar o ataque dos estudantes, também não há o que dizer para resguardar o caráter de alguém que deseja forçar um colega a aderir ao movimento paredista.

Os servidores estão completamente equivocados. O direito de fazer greve é tão fundamental quanto o de não fazer. A falha mais grave foi da segurança da Universidade que deveria ter tomado logo a dianteira das ações, garantindo a integridade dos grevistas e a liberdade dos dissidentes. Para isso, era necessário ter agido previamente, desmantelando rapidamente a obstrução dos acessos aos locais de trabalho.

Coerção de um assalariado sobre o outro não faz parte do direito de greve. Na verdade, intoxica e desmoraliza o exercício desse direito. Greve é direito constitucional. Mas qualquer intimidação ou cerceamento da liberdade em ambiente de trabalho é flerte com fascismo. Uma imensa falta de respeito às diferenças, e vai de encontro ao § 3º do art. 6ª da lei 7783/89 que, por analogia, rege a jurisprudência sobre greve no serviço público brasileiro. Portanto, até o momento em que gritavam “fascistas!”, os estudantes tinham razão.

Entendo que vivemos um momento de quase completa negação de direitos. As prioridades do Estado não se curvam à Constituição. Há expresso na Carta Magna o direito do servidor ao reajuste anual de seu salário. Na prática, está congelado há anos, enquanto políticos e ministros, em 2011, obtiveram aumentos que vão de 60% a 150%.

Por causa da falta de abertura do governo para o diálogo, os manifestantes radicalizam entre os seus. Somando a isso as ameaças e sanções anunciadas pelo governo, temos que os assalariados, extremamente abalados psicologicamente pelo processo, vêm perdendo toda a noção de estratégia. Afinal, cortar salário, na prática, é inviabilizar o direito de greve. Constituição mais uma vez rasgada.

Diante do risco de enfraquecimento iminente da greve, as lideranças de personalidade fascista se sobressaem. Elas inspiram confiança porque omitem ou realmente ignoram todas as consequências de suas “soluções finais” para o embate contra o governo. Contudo, e independente de quem está levando vantagem no conflito entre políticos e servidores, greve continua sendo convencimento. E convencimento depende das circunstâncias e competência para convencer. É incoerente ser contra o fascismo "de cima" sem ser contra o "de baixo".

Engana-se quem pensa que o maior inimigo do movimento de greve dos servidores públicos federais é o governo. O endurecimento da atual gestão é, sim, algo doloroso, ainda mais sabendo da incoerência entre o histórico dos que estão no poder e suas posições cínicas. Mas é a apatia de muitos dos funcionários antigos, e daqueles que têm relações de dependência política dentro das instituições, o fator que mais enfraquece a reação dos assalariados. Apatia essa que parece se espraiar para todas as áreas das vidas dessas pessoas, diga-se de passagem. É triste ver tanta gente sem compromisso com mais nada, beirando a depressão, senão afogados nela.

Liderar qualquer movimento social que se queira legítimo é difícil. A História mostra que os líderes, no longo prazo e nos casos de movimentos que lidam com grande contingente de pessoas que receberam educação de má qualidade, começam a dar ordens de agressão ou são assassinados pelos membros intolerantes e de personalidade colérica. Triste concluir que a história das esperanças das massas é basicamente isso: populismo e fascismo.


RomeroMaia@gmail.com

Comentários

  1. Roma, hoje, eu também tenho pensado nesse Brasil passando por uma revolução da educação, mas uma revolução da educação humanística. Afinal são a maioria dos nossos (e dos outros dessa Terra) líderes educados, mas "mal-educados", na medida em que se valem do conhecimento para dominar, não para somar.

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  2. Salve Roma!

    Que belo texto! Por estar imerso em alguns trabalhos, não fiquei sabendo dessa lástima catarinense. É triste saber que isso não foi um caso isolado, e que a tendência é seguir piorando. Os índices sociais parecem não acompanhar os indicativos econômicos, e isso tem despertado alguns segmentos da população. Me chama atenção essa movimentação em torno da educação, e do tanto que vem se falando (e pouco se fazendo) a respeito. Não acho que apenas a educação salva, pois se olharmos, quantas e quantas escolas de ENSINO TÉCNICO foram abertas nestes últimos anos. Precisamos repensar o lugar da educação, e sobretudo que educação é essa que tanto se alardeia por aí.

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