"Vá com Deus, Nossa Senhora e um balaio de santos"


Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de São Paulo em 31/12/2022 | 21h01

Vá com Deus, Nossa Senhora e um balaio de Santos - Estadão (estadao.com.br)

Dalson Figueiredo, Professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Catalisador do Berkeley Initiative for Transparency in the Social Sciences e visiting scholar na Universidade de Oxford - 2021/2022 - E-mail: dalson.figueiredo@ufpe.br

Romero Maia, Gestor de Pesquisas do IBGE e membro do Grupo de Métodos de Pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail: romeromaia@gmail.com


Era uma tarde de verão no Distrito Federal, Brasil, 30 de dezembro de 2022. O então presidente em exercício, derrotado na última eleição, e um grupo de assessores viajam para Miami, Estados Unidos, onde devem permanecer até 30 de janeiro de 2023, conforme despacho publicado no Diário Oficial [1]. Se você não vai dizer, digo eu. Existem exatas 60.345.999 pessoas extremamente felizes com essa viagem. Vá. Vá com Deus, Nossa Senhora e um balaio de Santos.


Essa frase, que serve de título, foi dita pelo professor Jorge Alexandre Barbosa Neves do Departamento de Sociologia da Universidade Federal de Minas Gerais, um dia após os atentados que aterrorizaram Brasília [2]. Bolsonaro, primeiro mandatário da república incapaz de se reeleger,  se despede da presidência violando um dos mais importantes ritos de um regime democrático: a alternância de poder. Ao se negar a passar a faixa e fugir do país aos 45 minutos do segundo tempo, deixa um legado de horror. Vejamos algumas evidências.


  1. 695 mil óbitos por Covid-19 (apenas os Estados Unidos perderam mais vidas durante a pandemia); [3]
  2. Desmatamento recorde na Amazônia [4];
  3. Assim como Macunaíma que só falou aos seis anos de idade, os dados disponíveis indicam que a média de horas líquidas de trabalho de Bolsonaro é  bastante reduzida [5];
  4. Sem provas, atacou reiteradamente à integridade do sistema eleitoral nacional [6];
  5. Abusou do poder político e econômico durante as eleições [7];
  6. Deteriorou os instrumentos de transparência[9];
  7. Propagou, de forma intencional e maliciosa, informações sabidamente falsas [10];
  8. Militarizou a burocracia civil [11];
  9. Capturou politicamente  as instituições de Estado, como PGR e PRF [12];
  10. Desmantelou várias políticas públicas, em particular os programas de combate à fome [13].

Claro que a lista não termina aqui. Foram tantas as desgraças nesses últimos quatro anos que, se devidamente catalogadas, poderiam facilmente rivalizar, em tamanho, com "Em Busca do Tempo Perdido" de Proust, considerado o livro mais longo do mundo. Por falar em tempo, o ano já está acabando e temos que organizar os preparativos da ceia de réveillon. Agora nos resta aguardar as últimas horas de um pesadelo político que destruiu vidas, dilacerou famílias e depredou as instituições do país. Vá, Vá simbora. Vá com Deus, Nossa Senhora e um balaio de Santos.


ps.: as referências podem ser acessadas pelo link do jornal.



romeromaia@gmail.com

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